Turning Red
…ensina a lição errada
O enredo de Turning Red da Pixar é bem específico – uma menina sino-canadense de 13 anos luta com as transições da puberdade no início dos anos 2000 em Toronto. No entanto, como todas as histórias, essa também trata de temas universais e inclui visões de mundo sutis, mas significativos, que precisam ser discutidos.
A animação é bem-feita e a representação de culturas e contextos diferentes é interessante. É uma pena, então, que muitas das ideias e mensagens de Turning Red sejam ruins. Apesar de seus méritos, o filme defende uma mensagem central equivocada: aceite quem você é, até mesmo seus vícios e impulsos, e não deixe que ninguém te impeça. Não tente domar a besta. Deixe-a sair.
Em Turning Red, a protagonista Meilin Lee (Rosalie Chiang) descobre que sua fera interior se manifesta quando suas emoções afloram – ela literalmente se transforma em um panda vermelho enorme. A história brinca com a antiga alegoria Jekyll e Hyde (ou Bruce Banner e o Hulk). Mas aqui, a alegoria vem com um twist moderno.
Tradicionalmente, a ideia nessas histórias de Jekyll/Hyde é que os humanos são conflitantes – nossas paixões carnais estão em desacordo com nossa vontade. Nossas paixões muitas vezes nos levando ao caos, enquanto nossa vontade nos ajuda a cultivar a virtude e a ordem e “conter” o dano potencial que nossas paixões podem infligir.
Claro, esta é uma ideia profundamente teológica também. Em Romanos 7, Paulo escreve sobre essa guerra dentro de si mesmo: “Não entendo o que faço. Pois não faço o que desejo, mas o que odeio… Sei que nada de bom habita em mim, isto é, em minha carne. Porque tenho o desejo de fazer o que é bom, mas não consigo realizá-lo.” (vv. 15, 18).
Nossa natureza caída orientada para o caos está sempre minando nossa vontade de sermos virtuosos e ordenados. Mas o que você não vai encontrar no Novo Testamento é um incentivo para acolher esses “dois lados de si mesmo” e aceitá-los como aspectos essenciais de “quem você é”. A Bíblia nunca nos encoraja a aceitar os lados bestiais de nossa natureza caída, como se o lado Hyde de nossa natureza fosse de alguma forma parte de um “verdadeiro eu” sagrado que não deveríamos esconder, mas sim soltar sem vergonha.
No entanto, nossa cultura hoje nos diz para fazer exatamente isso e o mesmo acontece no filme. A frase final de Meilin mostra bem isso: “Todos nós temos uma fera interior”, diz ela em um resumo didático dirigido às crianças que assistem. “Todos nós temos uma parte bagunçada, barulhenta e estranha de nós escondida. E muitos de nós nunca a deixamos sair. Mas eu fiz. E você?”
É uma mensagem inteiramente de acordo com o “ame quem você é!”, e “liberte-se e seja você mesmo” que vemos nos filmes da Disney há anos. Mas é uma mensagem terrível. Como a autora Jessica Hooten Wilson observa em um tópico no Twitter criticando o filme, a verdadeira liberdade é na verdade o oposto de deixar sua fera interior correr solta: “Você exibe liberdade por não ser escravo de seus desejos. Você mostra liberdade controlando a fera em você e permitindo que a natureza superior apareça.”
“Abrace a bagunça” pode ser um slogan fofo, mas se usado para justificar um comportamento pecaminoso sob a bandeira de “autenticidade” e identidade expressiva, é uma filosofia moral falida que vai, no final das contas, te escravizar ao invés de libertar.
Adaptação do texto divulgado em The Gospel Coalition – Unhelpful Advice in Turning Red